Fico irritada quando dizem que quem procura medicinas alternativas é burro, desprovido de espírito científico. Primeiro que uma coisa não é sinônimo da outra. Depois, vejo que é muito mais fácil atribuir burrice ao número cada vez maior de pessoas descrentes com a medicina tradicional ao invés de se perguntar o porquê disso. Por que tanta descrença com a medicina e com a ciência? Porque elas não cumpriram suas promessas. A medicina tradicional avançado muito no que diz respeito a exames e diagnósticos. Os tratamentos, porém, continuam seguindo os métodos antigos de arrancar, queimar, deixar partes faltando ou substituir por outro pedaço do corpo. Médicos receitam drogas potentes pra "ver no que é que dá" porque o efeito delas não é totalmente conhecido ou controlável. Muitas dessas drogas e radiações são as mesmas de cinquenta anos atrás. Sejamos sinceros, o avanço da medicina que gostaríamos de ver é este:
Medicina e ciência não são sinônimos; biologia é ciência, medicina é uma prática. A medicina se beneficia dos conhecimentos científicos relativos ao funcionamento do corpo, estatísticas, comportamento humano e manipulação de drogas, dentre outros. A ciência possui paradigmas próprios relativos à neutralidade, crítica, criação de conceitos; já a medicina trabalha com idéias relativas à normalidade, patologia, cura. Uma se baseia em idéias e outra em seres humanos. Ambas possuem sua própria história, que em alguns pontos se encontram, mas que jamais podem ser confundidas uma com outra. Por fim, seus objetivos e o público alvo de ambas é diferente - uma busca a comunidade científica e um avanço cada vez maior do conhecimento, enquanto a outra se propõe a restabelecer a saúde da sua clientela.
Dizer que algo não foi comprovado cientificamente, muitas vezes, quer dizer apenas que ninguém se deu ao trabalho de pesquisar. Não quer dizer que é uma tolice, que não dá certo, que não tem o menor fundamento ou que crer naquilo é sinal de burrice. Pesquisas surgem de centros de pesquisa, que por sua vez são dominados por necessidades e políticas próprias. O que gera mais pesquisa é o que está mais em voga, o que não é sinônimo de ser o mais necessário. A malária mata muito mais pessoas por ano do que a AIDS, mas esta última recebe muito mais atenção (e verba) da comunidade científica. Mesmo que exista vontade, pesquisas avançam devagar porque exigem condições materiais específicas. Às vezes o que impede o avanço científico numa determinada área é algo básico como a dificuldade de coleta de material. Os anticoncepcionais femininos foram desenvolvidos mais cedo porque as amostras de urina já estavam disponíveis em exames de grávidas, enquanto a masculina precisava ser coletada...
Existe um amplo conhecimento que não foi absorvido pela medicina. São práticas milenares, coisas transmitidas entre gerações, conhecimentos populares. Essas coisas foram testadas na prática e se mostraram eficazes. Elas apenas não foram testadas por cientistas dentro de laboratórios, seus resultados não constam em revistas científicas. Quem prega a fidelidade absoluta à "medicina científica" ignora a dificuldade de alguns em ter acesso a médicos, seja pelo custo ou pela própria falta de profissionais. Quanto mais sofisticados os exames, mais caros. Ou ignora a dúvida legítima gerada por tratamentos ineficazes, ou eficazes de uma maneira muito agressiva - lembro da piada que diz "a operação foi um sucesso, só que o paciente morreu". Eu vejo na busca pela medicina alternativa uma atitude crítica, de não olhar para a questão do conhecimento de maneira dogmática e não aceitar passivamente o que lhe é oferecido. Burro é quem faz o contrário.