Páginas

terça-feira, 29 de março de 2011

Ontem, 70 anos da morte de Virginia Woolf

Quando isso aconteceu, Orlando deu um suspiro de alívio, acendeu um cigarro e soprou em silêncio um ou dois minutos. Depois, chamou hesitante, como se a pessoa que procurasse pudesse não estar ali "Orlando?" Pois se há (por acaso) setenta e seis campos diferentes, todos pulsando simultâneamente na cabeça, quantas pessoas diferentes não haverá - valha-nos o céu- todas morando, num tempo ou noutro, no espírito humano? Alguns dizem que duas mil e cinquenta e duas. De modo é que é a cois mais natural do mundo uma pessoa chamar, logo que fique sozinha, Orlando? (se esse é seu nome), querendo com isso dizer Vem, Vem! Estou moralmente cansada deste eu. Preciso de outro. Daí as mudanças assombrosas que vemos em nossos amigos. Mas isso também não é muito fácil, pois, embora se possa dizer, como Orlando disse (achando-se no campo, e necessitando de outro eu) Orlando?, o Orlando de que ela necessita não vir; essses eus de que somos constituídos, sobrepostos uns aos outros como pratos empilhados na mão do copeiro, têm suas predileções, simpatias, pequenos códigos e direitos próprios, chamem-se como quiserem (e muitas dessas coisas não tem nome), de modo que um só virá se estiver chovendo, outro, se for num quarto com cortinas verdes, outro, se a Sra Jones não estiver lá, outro, se lhe pudermos prometer um copo de vinho - e assim por diante; pois cada pessoa pode multipilicar a sua própria experiência às diferentes condições que impões os seus diferentes eus- e algumas, de tão ridículas, nem podem ser impressas em letra de forma.

Orlando



Eu não sabia o que era ter um autor até conhecer Virginia Woolf. O seu autor é uma escolha literária, mas também uma escolha tão inconsciente como se apaixonar. E ao mesmo tempo é constante como um parentesco. Posso gostar de muitos outros autores, mas na hora de escolher um autor e um livro, meu coração não hesita em dizer: Orlando, Virginia Woolf.

11 comentários:

  1. Interessante, o que você diz sobre o "seu" autor. O que li antes de Virginia, eu era muito jovem e, hoje vejo, com certeza, não estava ainda preparada para ela. Depois de "Um Teto todo seu", ela é quase como uma amiga querida. Alguém que conheço, que, por páginas e páginas me falou com a alma.
    Ontem, quando li o no post do Milton, aquela carta suicida, não pude comentar. Como eu comentaria a despedida de uma amiga? Como comentar uma carta de despedida que é também uma carta de amor? Como encontrar palavras e romper o pasmo da perda?
    Talvez, você tenha razão, tem coisas, mesmo na literatura, que não são, exatamente, escolhas.

    ResponderExcluir
  2. Machado. Mas arrasto uma bela asa pra Duras.

    ResponderExcluir
  3. Eu também gosto pra caramba da Woolf, Caminhante. Li o Solar, a Mrs. Dalloway e As Ondas. Ainda não li o Orlando, que fiquei interessado graças a outro post seu, mas está na lista. Foi num parágrafo de mrs Daloway que o Garcia Márquez vislumbrou toda a Macondo, segundo o própria afirma. E foi graças a essa observação do colombiano que me cheguei até a inglesa.

    A propósito, estava lá no Milton fazendo o papel do Marcos, o que o levou a pegar a jogada e fazer o meu. Tá que a Virgínia vai morrer para o Marcos só quando ele próprio morrer, sei!
    As vezes a net é um porre e temos que jogar conforme o jogo, um tanto tontos.

    Abraços.

    ResponderExcluir
  4. Ah, o MEU escritor? Tu vais achar que é o Faulkner, né, mas enganas-te (a forma verbal correta é essa?).

    É o Thomas Mann. Grande amigo. Até hoje fui abduzido pela clínica de Davos, e moro na maravilhosa Montanha Mágica.

    ResponderExcluir
  5. Errata: não é O Solar, mas Passeio ao Farol. Conferi aqui em casa.

    ResponderExcluir
  6. É verdade, Nikelen, existe a idade certa. Li Machado e Guimarães na adolescencia e detestei. Há de se ter certa vivência pra entender certas coisas... Alias, a arte fica cada vez melhor à medida que envelhecemos, não?

    Sério, Borboletas? Não adivinharia. Assim como juraria de pés juntos que o do Charlles é Faulkner. (agora entendi o que rolou no Milton, Charlles. Estava mesmo achando tudo muito atípico). Não consegui ler Passeio no Farol...

    ResponderExcluir
  7. Também estou atrás de Rumo ao Farol. Programei de ler com meu alunos de H. Contemporânea II para pensarmos os traumas da I Guerra. Se alguém achar...

    ResponderExcluir
  8. Eu acho que tinha Passeio no Farol aqui e doei... Tentei ler várias vezes e achei chato.

    Milton - não é Bolaño! Acredito que pra nos deixamos impressionar por um autor assim, temos que ter lido numa fase mais impressionável da vida.

    ResponderExcluir
  9. Nikelen e Caminhante, tem Passeio ao Farol baratíssimo aqui:

    http://www.estantevirtual.com.br/q/passeio-ao-farol

    ResponderExcluir
  10. Caminhante, baby, passei a noite em angústias... insuspeito Machado? Insuspeita Duras? Quem você achou que fosse?

    ResponderExcluir

Desande aqui

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.