Gostaria de começar este texto dizendo que gostei mais de Absalão, Absalão! do que Luz em Agosto. Porque você disse que seria assim e no edição que eu peguei disse também que essa era a obra prima de Faulkner. Talvez o maior indicativo de que gostei mais de Luz em Agosto, seja o fato de que deixei o Capote de lado para terminá-lo. Desta vez, chegou um ponto do livro em que fui dar uma olhadinha (por isso que sempre leio mais de um livro ao mesmo tempo, preciso dar olhadinhas) e definitivamente não desgrudei do Capote - muito embora racionalmente eu não possa te dizer que o livro estivesse mais chato ou menos interessante em algum momento. Por essas sincronicidades, num dos contos Capote é convidado a falar de quais seriam seus autores preferidos. No meio de vários nome, diz "Faulkner, Luz em Agosto".
Absalão, Absalão! tem muito mais trechos memoráveis do que Luz em Agosto. E tem a capacidade de fazer o leitor avançar na leitura com a sensação de que nada foi dito, de que ainda escondem dele o principal. Era metade do livro e eu achava que a Srta Rosa não tinha chegado lá, e eu queria descobrir que lá era esse. As longas descrições e os paragráfos de mais de uma página não me assustaram, inclusive porque não surgiam a todo momento novos antepassados para confundir, como no Luz em Agosto. E quando a surpresa do livro - estava escrito na capa detrás do livro, junto com o "maior romance de Faulkner" - chegou, eu fui realmente pega de surpresa. Tive que parar de ler por alguns instantes, por tudo o que aquela mudança implicava. É de pirar mesmo. Gosto trajetória circular dos personagens, que de uma maneira ou de outra acabam tendo que se reconciliar ou enfrentar seu passado.
Talvez o grande diferencial entre os dois livros seja Joe. Aquela empatia dolorida que ele causa, pra mim, tornam Luz em Agosto mais atraente. Senti empatia com a Srta Rosa, mas até um certo ponto, porque é difícil entender passividade na nossa época. E, talvez mais importante do que tudo, em nenhum momento consegui odiar Thomas Sutpen. Talvez porque a identificação com os fracos (Joe) seja mais fácil; talvez a gente viva numa época tão dura que seja preciso muita maldade (Sutpen) para nos impressionar. Acredito que essa também devesse ser uma das grandes reviravoltas do livro, o momento em que entendemos as ações de Sutpen e deixamos de vê-lo como um demônio. Desde o início do livro eu o via como um homem solitário, determinado e rude. Ou seja, nada suficiente para despertar uma vontade de vê-lo sofrer e nem de vê-lo triunfar. E a falta de paixão é o pior sentimento que um leitor pode sentir por algum personagem.
Veja bem, estou comparando Faulkner com Faulkner. São dois grandes livros, é como perguntar se chocolate é mais gostoso puro ou na forma de mousse. Mais do que o enredo, o que mais me atrai em Faulkner é a maneira como as histórias se desdobram. No Luz em Agosto as coisas chegavam em direções diferentes, até formarem um correnteza e a acompanhamos enquanto dura, porque depois volta a se separar. Absalão, Absalão! é como um jogo de espelhos, onde vemos diversos reflexos e através deles tentamos adivinhar a verdadeira imagem. A edição que eu peguei (da Nova Fronteira) tem uma cronologia no final, que eu li mas achei meio anti-climax. Seria interessante só depois de muito tempo conseguir reunir as diversas versões e entender depois o que aconteceu. Mas nem todo mundo deve gostar de sair confuso de um livro.
Por hora, darei um tempo no opressivo e decadente ambiente sulista pós-guerra dos EUA. Depois de dois Faulkner seguidos, estou sentindo falta de leveza. Quando eu precisar refletir de novo, qual você me recomendaria?
Quer saber? Eu gosto MESMO é de Uma Fábula. Mas meu afeto vai para Enquanto agonizo.
ResponderExcluirEstou meio pasmo com as coisas que minha filha diz sobre alguns livros. É uma leitura muito fina. O detalhe é que ela não gosta de ler. Tenho que obrigá-la. O que ela disse sobre O Filho Eterno, do Tezza, foi muito legal. Ela disse BEM EXATAMENTE onde o cara se perdeu e onde voltou a se achar. Eu notei algo me incomodando na leitura -- mais ou menos como esse gato aê -- , mas não cheguei a tanto. Fico feliz, putz.
Ambiente sulista do entre-guerras, não? Pq Ab é de 1935 ou 36 e Luz é de pouco antes, não?
ResponderExcluirO Luz em Agosto é pós guerra e o Absalão, Absalão! (eta nome de livro ruim de digitar) pega um pouco antes, durante e depois.
ResponderExcluirSegundo a Wiki, isto é, sujeito a chuvas e trovoadas:
ResponderExcluir# As I Lay Dying (1930)
# Sanctuary (1931)
# Light in August (1932)
# Pylon (1935)
# Absalom, Absalom! (1936)
# The Unvanquished (1938)
Não sei, me baseio pelo que li. Abs.etc fala de um período muito longo. Stupen chega à cidade, compra um grande terreno, vai à guerra, volta... E no Luz em Agosto, a guerra já tinha passado.
ResponderExcluirDesculpe, Caminhante, pelo silêncio (tá explicado em seu blog eclético).
ResponderExcluirO Abs!Abs!, como vc disse, abarca um longo período temporal, mas quase todo ele se passa no século XIX, incluso aí a guerra de Secessão. Já o Luz em Agosto, não há marcos histórico definidos, mas sabemos que é no século XX _ como em Ulisses, que, em momento algum, fala da primeira guerra mundial, respira-se as mudanças drásticas que esse período do "entre guerras" gerou na mentalidade dos personagens.
Primoroso esse seu texto (engraçado eu não levar muito a sério quando me elogiam, mas não me contenho quando vejo algo de qualidade). Notei uma nova nota na sua escrita, a clave de sol faulkneriana que contagia depois da leitura dos livros de Faulkner. Uma vontade de falar tudo que passa lá no fundo, de uma forma intensa e nova. Fiquei com receio de vc não gostar do Absla!, pelo hermetismo e complexidade. É o número um da minha lista.
Recomendo, após descansar, a leitura de "O Povoado", que é da mesma estatura dos dois que vc leu, mas com um elemento novo: o humor. (Há uma passagem que vou te contar e estragar a pequena surpresa: a poesia romântica que segue um dos personagens não diz, especificamente, do amor entre um homem e uma mulher.)
Depois vc vai querer ler os dois livros que seguem essa trilogia: A Cidade, e, A Mansão. (Uma antiga namorada brincava comigo sobre o que viria depois, A Cômoda, A Gaveta ?)
Santuário foi o que mais se vendeu dele (ele adquiriu sua propriedade rural e um aeroplano, em decorrência). Nesse livro há um dos seus personagens mais assustadores, Popeye, de quem dificilmente vc terá afeição.
Mas, depois de Alasba! Alasba!, o que mais gosto é Desça, Moisés, um volume de contos que se relacionam entre si. Um conto em especial é, talvez, a coisa mais espetacular que Faulkner já escreveu. Trata-se de O Urso, uma peça sinfônica que até hoje me deixa de queixo caído, diante a sua beleza quase opressiva. Há, também, um outro conto, Pantalão Negro, cujo personagem principal é absolutamente comovente.
O A Fábula, o qual o Milton referiu, tenho por mim que seja uma das suas obras "menores", o que acaba por não querer dizer nada. Ele ganhou um de seus dois Pulitzers com ele, mas o defeito dessa obra é que seu estilo se torna cacoetes do que antes era força natural.
Enfim: O POvoado.
Li A Sangue Frio, do Capote. Livraço!
Abraço.